Risíveis Amores é uma das obras mais aclamadas do autor tcheco Milan Kundera (A Insustentável leveza do ser). O livro reúne sete contos autônomos e interligados ao mesmo tempo, os quais falam sobre o amor a partir de um olhar profundo e consequentemente risível.
Risível é tudo aquilo que é digno de riso; ridículo; que faz rir. Quando falamos sobre amor, logo temos a impressão que caminharemos sobre um terreno sólido, contudo, o homem é um ser complexo e, portanto, diante de um sentimento tão sublime como o amor, podemos observar posturas patéticas e que de fato levam ao riso.
Durante os sete contos, percebemos que cada personagem procura desfrutar de um status perante o outro, no qual tornar-se-á mais atraente. Escondem assim, aquilo que de fato são, buscando construir através do olhar do outro uma imagem daquilo que gostariam que fossem. Isso demonstra o quão difícil é para o homem apresentar-se de forma pura e sincera ao outro. O tempo inteiro escondem-se atrás de máscaras, em uma verdadeira representação do eu, uma teatralidade do amor no cotidiano.
O homem parece sentir uma necessidade pela farsa, por algo que o torne mais belo aos olhos do outro e não raras vezes de si mesmo. Encarar as próprias fragilidades não é tarefa simples, pois na medida em que tomamos consciência da nossa fragilidade, percebemos que muitas coisas ao nosso redor não passam de construções simbólicas e, sobretudo, nos deixam vulneráveis, fato o qual parece ser inerente ao amor, mas que busca-se fugir de todas as formas.
Assim sendo, por trás dessa farsa esconde-se aquilo que não queremos aceitar como pertencentes a nossa essência e a própria condição de humano, de tal modo que uma máscara não é somente algo que esconde aquilo que não queremos mostrar, mas sim, um símbolo de algo maior, a qual nos torna maiores, mais fortes, mais belos e, portanto, nos traz prazer.
“Podemos dizer que represento aquilo que Martin vive. Algumas vezes me parece que minha vida de polígamo não passa de uma imitação dos outros homens, mas não nego sentir certo prazer com essa imitação.”
No entanto, a de se considerar que uma farsa por mais bela que seja, ainda é uma farsa, isto é, não passa de uma ilusão, então o que nos leva a viver esse jogo ilusório? Será que não somos capazes de ir além do raso? De mergulhamos com a nossa alma no coração do outro e mostrarmos a fragilidade que nos forma?
"Iria eu renunciar ao jogo simplesmente porque ele é inútil?"
Essa incapacidade é o que há de risível nos contos, pois através do equívocos e mal-entendidos, fica evidente a dificuldade de mostrar-se verdadeiramente, assim como a dificuldade de comunicação, a qual traz uma série de problemas, sendo, inclusive, um problema extremamente atual.
A série de equívocos que se dão, acontecem, pois no jogo ilusório que se desenrola as atividades amorosas, tudo é interpretado segundo as próprias referências que são colocadas por quem analisa. Dessa forma, acredita-se ser amado ou amar alguém. Mas, tudo não passa das interpretações feitas sob máscaras, amarras e desejos intrínsecos de fugir da realidade. Todos parecem desfrutar de um status superior, como bons vivãs que caminham com leveza pela vida e divertem-se com ela.
"Klara ficou com medo e começou a dizer que eu era o culpado. Varri seu temores com a palma da mão e proclamei que o sentido da vida é justamente divertir-se com a vida, e se a vida é muito preguiçosa para isso, precisamos dar-lhe um pequeno empurrão. O homem deve sempre selar novas aventuras, éguas intrépidas sem as quais se arrastaria na poeira como um infante cansado."
Contudo, essa leveza esconde as suas fragilidades, e, por conseguinte, quem somos. Como será relacionar-se sem a máscara? A fragilidade do homem parece causar repulsa aos outros e, talvez, mais ainda a si mesmo. Assim, a teatralidade que se apresenta nas relações amorosas criam as verdades que queremos acreditar, pois como dizia Nietzsche - as verdades não passam de um jogo de linguagem e esquecimento.
Essa dificuldade de mostrarmos quem somos nos relacionamentos, demonstra a falta de sinceridade com que conduzimos os mesmos. Afinal, a verdade nem sempre é tão encantadora como uma mentira, mais que isso, uma rede de mentiras, de ilusões e que nos permite fugir daquilo que não queremos enxergar em nós mesmos. Os equívocos que se desenrolam nos contos são os mesmos da vida, em que a falta de comunicação que causa esses equívocos acontece em função da própria condição que nos colocamos na relação, onde existem personagens e não pessoas.
Tudo é colocado a fim de que pareça mais belo e agradável. Busca-se desesperadamente desvencilhar-se de qualquer feição que lembre a fragilidade. Entretanto, somos seres frágeis e mais frágeis ainda quando nos relacionamos. Esconder-se atrás de máscaras ou de uma busca eterna por prazer, não faz com que duas pessoas de fato se relacionem. Quando se olha através de uma máscara, olha-se apenas uma representação do eu, e que, portanto, pode ser muito mais facilmente descartado. Ou seja, enquanto a farsa constrói "pessoas" mais fortes e mais belas, a fragilidade desloca-se para os relacionamentos que se baseiam em mentiras.
Mentiras construídas para encobrir defeitos e fragilidades, para que possam sentir-se merecedores do amor, para que possam sentir novas sensações, sentir-se livres e gozar sem preocupações.
Essa é a busca pela leveza, pela condição fora da realidade, demonstrando a incapacidade do homem em pensar e se expressar de forma linear e verdadeira, o que gera todo um jogo ilusório, cercado de ironias e interpretações mal feitas, pois muitas vezes há uma diferença entre o que falamos e o que sentimos. Talvez por medo ou mesmo por uma incapacidade de se relacionar, nos escondemos atrás de máscaras, as quais nos deixam mais belos, atraentes e acima de tudo risíveis; tão risíveis que chega-se à tristeza, pois"[...] o jogo a fascinava; trazia-lhe novas sensações; por exemplo, o sentimento de uma irresponsável despreocupação."
"Ah, senhoras e senhores, como é triste viver quando não se pode levar nada a sério, nada e ninguém!"
Muito bom!
ResponderExcluirObrigado Elis!
ExcluirQue texto "genial", cara! Meus parabéns, vou já comprar o livro, identifiquei-me fortemente.
ResponderExcluirMuito obrigado pelo carinho, fico feliz que tenha gostado.
ResponderExcluirgostei amigo muito genial seu blog parabens
ResponderExcluirwww.lucasmaguinhooficial.blogspot.com
Obrigado!
ExcluirAdorei seu blog, sua página, seus textos! Esse em especial me instigou e fui buscar o tal do livro, os dois primeiros capítulos não me deixaram uma boa impressão, são ironias? O que querem dizer? E o machismo implícito? É parte da risada do autor também? haha :)
ResponderExcluirMuito obrigado! A intenção é justamente levar as pessoas a buscarem as fontes dos artigos. Em relação ao livro, a ironia percorre todos os contos, talvez com a leitura do livro inteiro você tenha uma boa impressão. O machismo dos personagens existem, não do autor, na verdade, ele usa esse machismo de uma maneira risível, ou seja, tudo aquilo que é digno do ridículo, demonstrando através da ironia como somos levados a atitudes dessa maneira quando nos relacionamos.
ExcluirEspero que ajude e goste da leitura do Kundera.