O
filme Entre Abelhas é uma boa surpresa no mercado cinematográfico brasileiro.
Acostumado a protagonizar comédias nível globo produções, Fábio Porchat dá vida
à Bruno, um personagem que representa um dos grandes problemas da modernidade
líquida, a saber, a “invisibilidade”.
No
filme, Bruno passa a deixar de enxergar as pessoas, como se estas fossem
invisíveis. O problema que o jovem atravessa é visto por muitos, inclusive, sua
mãe e um médico da família, como estresse relativo à sua recente separação. Seu
melhor amigo, ao longo da trama, também não demonstra a sensibilidade ideal
para perceber como o amigo estava mal. Sua ex-mulher, embora em alguns
momentos, demonstre alguma preocupação, também não se mostra sensível o
bastante para perceber a gravidade do problema.
Todos esses fatos levam ao cerne da questão desenvolvida no filme: a falta de sensibilidade do homem. A sociedade contemporânea, com todo o seu arsenal tecnológico, não conseguiu aproximar as pessoas, pelo contrário, nos tornamos mais individualistas e egoístas. Vivemos em bolhas afetivas sem a menor capacidade de empatia.
A forma como o problema de Bruno é trabalhado pelas pessoas próximas deixa claro a incapacidade de se colocarem no lugar dele. Ainda que, haja vontade, como no caso da sua mãe, essa vontade baseia-se em diagnósticos já definidos por ela, como problemas psicológicos ou psiquiátricos, já que em um diálogo com o filho, ela afirma que o avô paterno dele era maluco.
Sendo assim, a falta de empatia para se colocar no lugar do outro, assim como, a sensibilidade para perceber o que acontece ao seu redor, faz com que Bruno atravesse o problema sozinho. Com o passar do tempo, o processo parece estar em contínuo aceleramento, como se o personagem quisesse deixar de enxergar as pessoas. Isso de fato acontece, pois à medida que as pessoas não conseguem “enxergar” o seu problema, elas perdem o sentido de serem vistas para Bruno.
Contudo, o problema da falta de sensibilidade não está apenas no outro. Bruno também faz parte do universo de bolhas que nos encontramos. Ele questiona em vários momentos o que levou o seu casamento ao fim, que tudo aconteceu muito rápido, embora, sua ex-mulher enfatize que a separação não aconteceu do nada ou tão rapidamente como ele pensa.
Ou seja, o personagem é incapaz de enxergar os fatos que levaram ao fim seu casamento. O seu próprio amigo chega a dizer que talvez ele não consiga perceber que o problema é ele.
“Às vezes é difícil perceber que o problema é você?”
Desse
modo, o fato dele deixar de enxergar as pessoas enfatiza ainda mais a sua
também incapacidade de enxergar o que acontece ao seu redor, como os fatos que
levaram ao término do seu casamento.
Essa falta de sensibilidade trabalhada na trama não foge à realidade. Somos (e estamos ficando mais) frios e insensíveis, incapazes de se colocar no lugar do outro e de perceber o que de fato acontece. Posto que, abdicar de toda insensibilidade e individualidade é muito difícil, preferimos viver nas nossas bolhas, sozinhos e isolados, como revela o próprio Bruno em um diálogo com seu psiquiatra, que prontamente o responde:
“- Eu quero é que suma logo todo mundo.
- Pra você é mais fácil viver no mundo sozinho?”
Embora,
seja mais fácil viver sozinho, é impossível ser feliz sozinho. Ao criarmos a
atmosfera de individualidade que forma o mundo contemporâneo, ficamos todos
cegos, pois não conseguimos enxergar o outro. E se não conseguimos enxergar o
outro, muito possivelmente não conseguiremos enxergar a nós mesmos, uma vez que
uma existência galgada apenas em si mesmo é uma existência muito fraca.
“O meu medo hoje é acordar e não me ver no espelho. Ate que ponto a gente sabe que existe?”
Essa
fragilidade aumenta ainda mais, quando tudo acontece com enorme velocidade.
Pessoas vêm e vão o tempo inteiro das nossas vidas, mas quantas ficam?
Conseguimos ser importante para quem?
“Com o tempo todo mundo vai sumindo pra todo mundo.”
No
filme, Bruno ao deixar de enxergar as pessoas concretamente, apenas consolidou
o que já havia acontecido no terreno psicológico; fazendo-o perceber que ele já
estava sozinho, que os outros já estavam sozinhos, e não havia diferença se ele
podia ou não vê-los.
“Será que deixando de enxergar todo mundo, você passou a se enxergar mais?”
Soube, ao deixar de enxergar as pessoas, o quão difícil é viver olhando para o outro,
pois a existência humana é cheias de vicissitudes. Não nascemos sabendo que
tipo de abelhas somos, mas sabemos que assim como as abelhas, vivemos em uma
coméia e, assim, precisamos do outro e como precisamos do outro, é preciso
enxergá-lo.
Em
um mundo de cegos, enxergar pode te fazer diferente, pode te fazer mudar, mas
lembre-se de uma coisa: mudar pode ser bom.
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