Ao longo da história
humana, o homem sempre esteve preso a determinadas formas de agir, ou seja,
viviam de acordo com o centro norteador da vida. Em dado momento a vida era
pautada e explicada através do misticismo e da religiosidade. Com o advento da modernidade,
o racionalismo assume o controle da vida e, portanto, explicações religiosas
sobre o mundo ficam em segundo plano. E, hoje, chegamos à chamada
pós-modernidade, a qual se caracteriza por não possuir um centro norteador para
a vida.
O homem contemporâneo,
assim, goza de extrema liberdade, uma vez que o racionalismo mostrou-se
insuficiente para explicar a vida, assim como falhou nas suas inúmeras
promessas de construir um mundo melhor, vide as duas grandes guerras, em que a
razão foi utilizada em sentido totalmente contrário.
De outro lado, a
religiosidade que já havia enfraquecido com o advento da modernidade, teve o
seu golpe final dado no século XIX por Nietzsche, o qual na sua parábola do
homem louco (é irônico matar Deus através de uma parábola) apresenta a morte de
Deus, o qual foi morto pelo homem moderno.
“O homem louco se lançou para o meio deles e trespassou-os com seu olhar. “Para onde foi Deus?”, gritou ele, “já lhes direi! Nós os matamos – vocês e eu. Somos todos seus assassinos! Mas como fizemos isso? Como conseguimos beber inteiramente o mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte? Que fizemos nós ao desatar a terra do seu sol? Para onde se move ela agora? Para onde nos movemos nós? [...] Deus está morto! Deus continua morto! E nós os matamos.”
Dessa forma, o ser
pós-moderno é um indivíduo extremamente livre, cabendo a si mesmo determinar
qual caminho levará. Entretanto, essa liberdade apresenta um peso enorme, uma
vez que dar um próprio sentido à existência ou aceitar que a vida não possui
sentido algum não é tarefa das mais simples e diante disso, uma característica
vem estabelecendo-se, qual seja, o retorno da religiosidade.
Esse retorno da
religiosidade parece-me acontecer, pois a dificuldade encontrada para lidar com
uma vida sem sentido chegou ao seu auge. Nietzsche já falava que os homens
sentem dificuldade em viver uma vida sem os consolos e próteses que ajudam a
superar as dificuldades da vida, segundo ele a história da humanidade é a
história da invenção desses consolos.
Através da
religiosidade busca-se diminuir o sofrimento da existência, posto que a
experiência humana não seja agradável de modo geral. Somos seres precários que
sabemos menos que o necessário para viver. Assim, acaba valendo qualquer coisa
para chegar ao fim do dia e achar que este valeu a pena, inclusive ter uma
religião.
A religião serve, dessa
maneira, como uma muleta existencial, algo que ajuda a superar as vicissitudes
da vida, em geral com a ideia de que além da nossa existência, há algo superior
e melhor, como o paraíso, fazendo-nos suportar todas as dificuldades
relacionadas ao viver.
A própria estrutura
pós-moderna ajuda a explicar o ressurgimento da religiosidade, pois ao estar
submetido à extrema liberdade, o homem sente vertigem, ou seja, perde os
sentidos e sente dificuldade em caminhar sozinho, precisando de algo que o
ajude a caminhar, voltando mais uma vez a Nietzsche e as muletas existenciais.
Essa vertigem também
produz medo e o medo sempre leva muitas pessoas à religião. É sempre mais fácil
encher um templo pelo medo do “diabo” do que pelo amor a Deus. Outro fator que
aumenta o medo é a sensação de que o mundo está cada vez pior e mergulhado em
violência e imoralidade. Assim, pelo medo de encarar o mundo, muitos buscam na
religião um refúgio, ou a esperança de que exista algo melhor, mesmo que seja
em outro plano.
Para Nietzsche, essa
religiosidade representa a fraqueza e a covardia do homem, o qual busca através
de um Deus o significado da existência, fugindo de si e do autoconhecimento, como
também da razão esclarecida, que é a razão absoluta da autodeterminação, isto
é, sem Deus.
De fato, a nova
religiosidade tem como característica proporcionar grilhões aos quais os
indivíduos se prendem e, logo, deixam de produzir suas verdades, delegando-as à
religião. Esta acaba servindo como a fuga do autoconhecimento e os homens a fim
de livrarem-se da obrigação de pensar, fazem tudo que a religião determina.
Como já dito, a
existência humana é frágil e dolorosa, portanto, ter uma religião que proporciona
uma diminuição no desconforto de existir é aceitável. Entretanto, ter uma
religião que torna o indivíduo tão entorpecido que não consiga enxerga nada ao
seu redor não é saudável e, por vezes, risível. Não é por acaso que Marx falava que
a religião era o ópio (no século XIX, era usado como uma espécie de morfina) do
povo, uma vez que agia como uma droga que diminui a dor de existir.
Entretanto, apesar da
nova religiosidade ser muito difusa e muitas vezes produzir certa cegueira
diante da vida, a de se considerar que a religião tem um poder extraordinário
de consolação diante das vicissitudes da vida, um poder que a razão não possui,
por isso há um retorno à religiosidade e não à razão.
A pós-modernidade nos
deixou órfãos e, por conseguinte, com dificuldades em enfrentar a empreitada da
vida sozinhos. O homem percebeu que a vida sem um guia não era tão agradável
quanto parecia e, assim, busca através da religião estabelecer signos, afinal é
impossível viver sem signos culturais (sejam eles metafísicos ou não).
Embora, existam
inúmeros problemas relacionados ao retorno da religiosidade, que em muitos casos,
criam indivíduos sem nenhuma capacidade intelectiva e de discernimento, devemos
considerar que viver sem nenhum conforto que responda às angústias que a
existência nos proporciona seja para poucos, como Nietzsche.
O fato é que encarar a realidade em
sua totalidade é impossível para o homem, sempre haverá questões que a ciência
não explicará e diante disso, o Deus morto no século XIX, parece ressuscitar.
Ressuscita, porque o homem não se
tornou mais forte com o desenvolvimento tecnológico, continuamos frágeis,
sentimos medo, sobretudo, o medo da solidão, a qual se intensificou. E diante
da solidão, o indivíduo sozinho deve decidir qual caminho sua vida levará, e
nessa pluralidade discursiva, muitos têm escolhido a religião.
Se você é um desses, apenas um
conselho, tente não escolher um Deus "diet" que não engorda, pois,
assim, você não estará escolhendo um Deus, mas sim um pedaço de bolo (sem glúten é claro).
O homem louco se lançou para o meio deles e trespassou-os com seu olhar. “Para onde foi Deus?”, gritou ele, “já lhes direi! Nós os matamos – vocês e eu. Somos todos seus assassinos! Mas como fizemos isso? Como conseguimos beber inteiramente o mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte? Que fizemos nós ao desatar a terra do seu sol? Para onde se move ela agora? Para onde nos movemos nós? [...] Deus está morto! Deus continua morto! E nós os matamos.”
ResponderExcluirÉ justamente esta parábola que contextualiza a "morte de Deus". Indevidamente colocam Nietzsche como um assassino de Deus. Sua relação com a religião e com Deus é conflituosa, coisas da infância de uma criança criada por um crente fervoroso.
Nietzsche é atormentado pelos dogmas que limitam o homem a uma insignificância conformista. No contexto geral, matamos Deus para Nietzsche como matamos nossos pais para Freud. Para tornarmo-nos adultos. Para mostrar nosso significado e nossa significância. Para sermos discurso e não somente verbo.
infelizmente temos grilhões em nossa genética e uma enorme dependência de um poder superior, seja ele provindo de Deus, de nossos pais, professores, chefes, das autoridades constituídas ou do síndico do prédio.
Mal entramos na maturidade intelectual. Pobre Nietzsche, visionário Nietzsche, sua visão está longe. Somos humanos, demasiados humanos. O livre arbítrio é um fardo, a responsabilidade é um fardo, assumir nossas fraquezas é dolorido demais.
O problema de ressuscitar Deus é que estamos dando autoridade àqueles que espertamente falam em Seu nome. Não estamos nos tornando melhores ou mais espiritualizados por conta disso, apenas escravos cegos de uma devoção cega. E Deus provavelmente morre de desgosto.
Volta a questão de Deus está morto... morto sim. De vergonha do fanatismo e da intolerância dos tempos atuais. (Mauro Gouvêa)
Mauro com sua estimada sabedoria. A nossa sintonia é muito boa, você sempre capta a alma dos meus textos. Que continue assim. Abraços!
ExcluirPerfeita interpretação, Mauro! Nietzsche ficaria orgulhoso.
ExcluirAdorei Marcos, Deus ficou orgulhoso rs...
ExcluirÉ sério. Eu estou passando muito mal
ResponderExcluirIsso se resolveria muito facilmente se as pessoas utilizassem a inteligência dada por Deus para aplicarem a Bíblia à realidade humana em todas as suas abrangências (histórica, científica, política e econômica) e não se contentassem com uma interpretação feita por terceiros... Aí sim elas descobririam que Deus é bem mais do que julga a nossa vã filosofia!
ResponderExcluirTambém acho Clara!
ExcluirA sabedoria do Shakespeare nunca deixa de ser surpreendente.
“Há mais mistérios entre o Céu e a Terra do que sonha a nossa vã filosofia.”
Principalmente economica e nao colocasse o Mantega !
ResponderExcluirINTERESSANTE COMO SE CUMPRIU O ADÁGIO, ELE MORREU LOUCO EM UM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO, GRITANDO E PEDINDO PERDÃO A DEUS!? SEGUNDO HISTORIADORES..
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